Tendo
como cenário as ruas e as areias das praias de Salvador, Capitães da
Areia trata da vida de crianças sem família que viviam em um velho
armazém abandonado no cais do porto da capital baiana. Os motivos que as uniram
eram os mais variados: ficaram órfãs, foram abandonadas, ou fugiram dos abusos
e maus tratos recebidos em casa.
O
livro é dividido em três partes, porém, antes delas, existe uma sequência de
pseudo-reportagens e depoimentos, explicando que o grupo Capitães da Areia é
composto de menores abandonados e marginalizados, que aterrorizam Salvador.
A
primeira parte em si, "Sob a lua num velho trapiche abandonado",
conta algumas histórias quase independentes sobre alguns dos principais
Capitães da Areia. Eram aproximadamente cem capitães, e mais de quarenta
deles, meninos de todas as cores, entre nove e dezesseis anos, dormiam nas
ruínas do velho trapiche. Tinham como líder Pedro Bala, rapaz de quinze anos,
loiro, com uma cicatriz no rosto, e que mais tarde descobre ser filho de
um líder sindical morto durante uma greve. Bala era uma espécie de pai
para os garotos, mesmo sendo tão jovem quanto os outros. Generoso e valente, há
dez anos vagabundeava pelas ruas de Salvador, conhecendo cada palmo da cidade.
Durante
o dia, maltrapilhos, sujos e esfomeados, os meninos mostravam-se para a
sociedade, perambulando pelas ruas, fumando pontas de cigarro, mendigando
comida ou praticando pequenos furtos para poderem comer. Esse contato precoce
com a dura realidade da vida adulta fazia com que se tornassem agressivos e
desbocados.
Além
desses pequenos expedientes, os Capitães da Areia praticavam roubos maiores, o
que os tornou conhecidos, temidos e procurados pela polícia, que estava sempre
em busca do esconderijo e do chefe dos capitães. Esses meninos, se pegos,
seriam enviados para o Reformatório de Menores, visto pela sociedade como um
estabelecimento exemplar para a criança em processo de regeneração, com
trabalho, ótima comida e direito a lazer. No entanto, esta não era a opinião
dos menores infratores. Sabendo que lá estariam sujeitos a todos os tipos de
castigos e crueldades, preferiam as aflições das ruas e da areia à essa falsa
instituição.
No
dia-a-dia, o bando contava com o apoio amigo de alguns adultos. Don'Aninha, uma
mãe de santo, sempre os socorria em caso de doença ou necessidade. Além dela, o
Padre José Pedro, introduzido no grupo pelo Boa-Vida, conhecia o esconderijo
dos capitães. Aos poucos, o velho conquistou a confiança do grupo, indo com
frequência visitá-los, levando um pouco de carinho e compreensão. O pescador
Querido-de-Deus e o estivador João-de-Adão também tinham a confiança dos
meninos, que, por sua vez, não mediam esforços para recompensar esse apoio.
Um
dia, Salvador foi assolada pela epidemia de varíola. Como os pobres não tinham
acesso à vacina, muitos morriam, isolados no lazareto. Almiro, o primeiro
capitão a ser infectado, ali morreu. Já Boa-Vida teve outra sorte: saiu de lá,
andando. Dora e o irmão, Zé Fuinha, perderam os pais durante a epidemia. Ao
saber que eram filhos de bexiguentos, o povo fechava-lhes a porta na cara. Não
tendo onde ficar, os dois acabaram no trapiche, levados por João Grande e pelo
Professor.
A
segunda parte, "Noite da grande paz, da grande paz dos teus olhos",
marca a história de amor que surge quando Dora se junta ao bando. A
confusão, causada pela presença de uma menina no armazém, foi contornada por
Pedro. Os meninos aceitaram-na no grupo e, depois de algum tempo, vestida como
um deles, participava de todas as atividades e roubos do bando, tornando-se
a primeira "capitã da areia", uma mãe e irmã para todos. Pedro Bala
considerava Dora mais que uma irmã: era sua noiva. Ele, que não sabia o que era
amor, viu-se apaixonado. O que sentia era diferente dos encontros amorosos com
as negrinhas ou prostitutas no areal.
Quando
roubavam um palacete de um ricaço na ladeira de São Bento, os meninos foram
presos. Parte do grupo conseguiu fugir da delegacia, graças à intervenção de
Bala, que acabou sendo levado para o Reformatório. Ali sofreu muito, mas
conseguiu fugir. Em liberdade, preparou-se para libertar Dora. Um mês no
orfanato foi o suficiente para acabar com a alegria e a saúde da menina que,
ardendo em febre, se encontrava na enfermaria.
Após
fugirem do reformatório, Pedro, Professor e Volta-Seca invadiram o orfanato, e
saíram levando Dora consigo. Pedro Bala e Dora, então, se amaram pela
primeira vez, na areia da praia. Infelizmente, não resistindo à forte
febre, ela morreu na manhã seguinte. Don'Aninha embrulhou-a em uma toalha de
renda branca e Querido-de-Deus levou-a em seu saveiro, jogando-a em alto mar.
Pedro Bala, inconsolável e muito triste, chorou com todos a ausência de Dora,
que marcava o começo do fim para os principais membros do grupo.
A
terceira e última parte, "Canção da Bahia, canção da liberdade", vai
nos mostrando a desintegração dos capitães. Alguns anos se passaram e o
destino de cada um do grupo foi tomando rumo. Graças ao apoio de um poeta, o
Professor foi para o Rio, e já estava expondo seus quadros. Pirulito, que já
não roubava mais, entrara para uma ordem religiosa. Sem-Pernas se matou quando
fugia da polícia. Volta-Seca estava fazendo o que sempre tinha sonhado:
aliou-se ao bando de seu padrinho, Lampião, tornando-se um terrível matador de
polícia. Gato, perfeito gigolô e vigarista, deixou sua amante Dalva e foi para
Ilhéus, trapacear coronéis. Boa-Vida, tocador de violão e armador de bagunças,
pouco aparecia no trapiche. João Grande embarcou, como marinheiro, num navio de
carga do Lloyd Brasileiro.
Após
o auxílio na greve dos condutores de bonde, o bando Capitães da Areia de Pedro
Bala tornou-se uma "brigada de choque", intervindo em comícios,
greves e em lutas de classes. Assim como Pirulito, Bala havia encontrado sua
vocação. Passando a chefia do bando para Barandão, seguiu para Aracaju, onde
iria organizar outra brigada, se tornando um líder revolucionário
comunista. Anos depois, Pedro Bala, conhecido organizador de greves e perigoso
inimigo da ordem estabelecida, é perseguido pela polícia de cinco estados.
Os
Capitães da Areia são heróicos, espécies de “Robin Hood’s”, que tiram dos ricos
e guardam para si próprios (os pobres). Na história, o Comunismo é mostrado
como algo bom. No geral, as preocupações sociais dominam, mas os problemas
existenciais dos garotos os transformam em personagens únicos e corajosos,
legítimos Capitães da Areia de Salvador.
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